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domingo, 7 de junho de 2009

Quanto tempo demorou pra párar de doer!


Quanto tempo demorou pra párar de doer, muito tempo, talvez ainda doa, não, com certeza dói muito. Mas ela resolveu se levantar todos os dias pra ficar prostada na varanda. Ali, com o olhar perdido no horizonte. Num misto de saudade e espera.
Foi numa curva da estrada, próximo dali. Foi lá que perdeu seu filho mais velho, naquela curva vagam as retinas cansadas de D. Amélia, as rugas empoeiradas e os lábios curvados davam o tom do que se tornou a sua vida.
Um dia passa por ali uma devota segurando Nossa Senhora em pequeno altar, pára e vê àquela figura na varanda, uma prosa, uma fé e a imagem fica cravada na curva para amparar a alma do filho querido de D. Amélia.
Na mesma noite uma tempestade cai sobre a cidade, sobre a casa de D. Amélia, sobre a Santa protetora das almas perdidas em curvas. Ela se assusta com a possibilidade da Santa quebrar e seu filho continuar vagando. Não se incomodou com os trovões, raios, ventos e medos.
Com o guarda-chuva foi salvar tudo que restou naquela curva de proteção, de saudade, de amor. Ficou lá, párada, chovendo dentro da própria alma. Em pé levava o guarda-chuva mais pra Santa do que pra si e seus pés de sandálias virou pés de barro e lama.
Tudo escuro, molhado...só o barulho da chuva tornando-se silêncio. Mas existem passos ali, uns que se aproximam sem disfarçar a pressa.

_ Olá, a senhora o que faz aqui nesta chuva? Jesus, toda molhada...vai resfriar ou coisa pior. Vamos pra um lugar seguro...

_ A santa...

_Levemos conosco, ora esta, deixa que eu carrego...Grudou no pequeno altar da imagem e na figura molhada e galgaram o espaço para a casa seca e segura. A mulher se deixou levar, como algo bom a ser reencontrado.
Deixou se carregar pela mão até sua casa, até roupas secas, até uma cama quente. De manhã como acreditava, foi um sonho.
Sentou na varanda e verteu toda àquela chuva pelos olhos e só quando o pôr do sol chegou é que secou um pouco do que transbordava. Neste instante irrompe na varanda uma senhora e muitas crianças, com certeza, uma mãe e muitos filhos.

_ Tarde vizinha, como está? Melhor. Trouxe um pouco de bolo e mel, vamos cuidar pra não gripar. Deixa eu me apresentar: Sou quem te ajudou ontem, Esperenciana, a suas ordens ...ah! e esta renca são meus filhos...

_ Ohhh criançada vem dar benção pra vó...
E assim foram os novos dias de D. Amélia.
Ana Laura.

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